A
caminhada cristã não é fácil. É interessante que na medida em que os
anos passam, vamos descobrindo que nem todas as coisas na vida são tão
simples e divertidas como pensávamos quando erámos crianças. Na jornada
cristã este movimento não é muito diferente. Nem tudo é doce e brilhante
como aparenta e nem só de dias ensolarados se faz a vida. Mas nas
adversidades (e diante das nuvens) podemos enxergar a graça de Deus e
seu zelo, aprender muito com aquilo que se opõem e descobrir o que
realmente tem – ou deveria ser reconhecido como tendo – valor para
nossas vidas.
O
livro de Atos dos Apóstolos apresenta diversos episódios cuja fé dos
cristãos em geral e dos apóstolos em específico eram moldadas pelas
adversidades. Neste estudo vamos nos ater ao relato de At 16.12-40.
Paulo e Silas estavam em Missão conforme textos anteriores (junto com
Lucas e Timóteo) e alguns fatos anteriores mostram conversões
acontecendo, através da pregação do Evangelho e pela obra do Santo
Espírito (At 16.13-15). Deus estava com seus servos assim como permanece
com os Seus nos dias de hoje. Talvez para muitos a sequencia de fatos
que foram se desenrolando podem soar como injustas para quem estava tão
somente fazendo a obra de Deus. Vejamos.
A falsa religião como fonte de lucro
Passando
pela maravilhosa experiência de compartilhar o Evangelho e ver corações
– como o de Lídia, v.14 – se prostrando ao Senhor, encontramos mais uma
vez a forma impressionante como a religiosidade pode engordar os bolsos
de líderes nefastos. Tal prática não nasceu ontem, ela está enraizada
na humanidade como um culto paralelo cujo fim é a riqueza e o bem-estar
momentâneo. Enquanto Paulo e Silas avançavam na pregação do Evangelho e
na comunhão com os novos crentes, uma jovem possessa “que tinha um
espírito adivinhador” os seguia gritando uma suposta glorificação ao
nome de Deus (v.17), porém tal glória era falsa e tal jovem servia tão
somente como fonte de lucro aos seus senhores. A jovem estava possessa
por um espírito mau e era explorada por seus senhores.
Outras
passagens nos mostram – ainda em Atos – a luta da Igreja contra estas
investidas. Veja por exemplo Pedro contra Simão em At 8.14 e Paulo com
Bar-Jesus em At 13.4. No caso de Simão, seu ato pecaminoso passou a
nomear a prática de aferir lucro no comércio das coisas sagradas:
“Simonia”. Pela narrativa da história da igreja encontra-se na obra
“Apologia” de Justino Mártir – datada de 150 a.D. que posteriormente
Simão passou a ser seguido por muitos e se autodenominava como
“Manifestação do Deus Supremo”.
Segundo os versículos de At 16.16-19 diante de uma perturbação diária
gerada pela jovem possessa, pois poderia com sua “glorificação” levar
as pessoas a desacreditar o Evangelho, associando-o ao ocultismo 1,
Paulo se aborreceu e ordenou que o espírito saísse da jovem, ao que
pela ordem e sujeito ao nome de Jesus tal espírito foi expulso. Deus foi
verdadeiramente glorificado, enquanto a fonte de lucro de homens
perversos secou. Não houve júbilo a estes homens, mas tal decepção que
denunciaram Paulo e Silas às autoridades, e em praça pública foram
acusados e espancados sem chances de defesa.
Muitos de nós se indignariam diante de Deus com perguntas do tipo “Por que? Qual o motivo, oh Deus!”. Paulo e Silas estavam fazendo a obra de Deus e ainda assim foram injustamente condenados.
A
Verdade não trouxe alegria aos ímpios. Muito tem a ensinar o texto de
At 16.20-24. Por mais que a jovem estivesse livre, o que realmente
interessava era o lucro perdido. Além disso, aprendemos que todo aquele
que defende a fé cristã e está comprometido com o Evangelho deve estar
atento, em alerta constante em relação às amizades falsas e
interesseiras, pois para muitos a glorificação da jovem poderia inflar o
ego do pregador quando na verdade visava desviar o culto. E ainda:
estar preparado para ferrenha oposição e “revolta dos magistrados” que
declaram guerra contra Paulo e Silas.
Paulo cura a menina; no entanto, o bem, em vez de trazer-lhe glória e gratidão, trouxe-lhe açoitamento e prisão. Há um dito popular que diz: ‘Não há mal que não traga algum bem’. Talvez também devêssemos dizer o oposto: ‘Não há bem que não traga algum mal’. Talvez isso seja um tanto exagerado, mas, com frequência, é verdade. Vivemos em um mundo caído que, por essa razão, é dominado pelas estruturas do pecado. Por isso, quando nos opomos ao pecado, estamos nos opondo aos interesses de alguém. Paulo cura a menina; mas ao fazer isso, ele prejudica os interesses econômicos dos donos dela, que, portanto, acusam-no e conseguem que seja açoitado e preso. 2
Um costume maligno foi destronado e a fé dos servos de Deus estava posta a prova.
Um exemplo de como se portar diante da adversidade e o milagre da salvação
Não
vamos nos ater a pensar no que a maioria faria diante de tudo que
estava sobrevindo naquele momento de humilhação. Vamos focar nosso olhar
para o exemplo de Paulo e Silas. Trancafiados injustamente, acoitados,
pés presos ao tronco, entoavam louvor a Deus orando e cantando hinos.
Deus respondeu rompendo as cadeias e colocando o injustiçado em
liberdade.
Interessante
que a resposta de Deus não era um fim em si própria, mas um meio de
fazer um obra ainda maior e trazer glória ao nome dEle!
A
liberdade que Deus proporcionou aos Seus servos foi o bálsamo em
relação ao injusto castigo que lhes foi afligido sem a menor
possibilidade de defesa.
Diante
de tantos feitos maravilhosos e miraculosos, o maior dos milagres chega
à casa do carcereiro. Aquele que estava outrora separado e apartado
pode se achegar à graça salvadora de Jesus: “Senhores, que é necessário
que eu faça para me salvar?” pergunta este homem no verso 30. Perceba
que somente àquele cujo Espírito de Deus colocou a consciência de perda e
condenação pode clamar para ser salvo. Somente o perdido pode clamar
pela salvação.
Naquela
mesma noite não somente o carcereiro como todos os seus foram
alcançados. Era Deus – ao Seu tempo – produzindo o bem das
circunstâncias que apenas registravam o mal e a injustiça.
Não
há nada de mágico neste contexto e neste versículo em específico (“Crê
no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa.” Atos 16:31) uma
vez que a salvação de um indivíduo não depende da crença de outrem. Foi
pela ação de Deus e pelo poder de Sua palavra que o Evangelho pregado
alcançou morada e a contemplação da misericórdia divina.
Concluindo
Depois
de toda a luta enfrentada, mesmo fazendo aquilo que estava certo e que
era para Deus e Seu Reino, ainda que diante da injustiça dos homens,
Paulo e Silas não esmoreceram na fé. Pelo contrário, houve ainda tempo
de retornarem aos irmãos recém-convertidos e os encorajarem. Deus deu a
estes homens a oportunidade de ver o fruto de seu trabalho:
Esta
é nossa luta constante. Ainda que sob o céu nublado das adversidades é
possível ver a graça de Deus presente, e ainda que tudo possa parecer
desfavorável, o Senhor pode fazer daquilo que é mal, o bem. Confiança é
algo que se constrói na certeza de estarmos com Deus em nosso dia-a-dia,
e mesmo que tudo pareça difícil, sempre haverá oportunidade para
consolar e encorajar o próximo, ainda que muitas adversidades nos possam
parecer injustas.
Vamos prosseguir, sempre olhando para o Alvo!
Notas:
1 STOTT, John R.W. A Mensagem de Atos. ABU Editora. São Paulo: 1994. p. 298
2 GONZÁLEZ, Justo. Atos. Hagnos. São Paulo: 2011. p.232
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