Professor da UFMT é primeiro brasileiro indicado ao Nobel da Educação
Do Cenário MT
Márcio Andrade Batista é mestre em
Engenharia química e está terminando seu doutorado na Universidade
Federal de Uberlândia. Paulista, Marcio se mudou para Barra do Garças –
MT em 2010, onde ministra aulas na UFMT. Mas o que tem de diferente na
história de Marcio? Bem simples, ele está concorrendo o “Global Teacher
Prize”, o prêmio Nobel da Educação, Marcio é o primeiro brasileiro a ser
indicado ao prêmio.
A premiação é nada mais nada menos do
que US$ 1 milhão, são 50 candidatos de 29 países. O anúncio do vencedor
será no mês de Março em Dubai.
Márcio nos deu uma entrevista
exclusiva, da qual falou a respeito da premiação, sua carreira
profissional, perspectivas para a ciência brasileira e pontos de vista a
respeito da educação do nosso país.
Como funciona essa seleção?
É o que chamam na academia de
memorial, as coisas que você fez que podem ser consideradas relevantes e
contribuiu para o status da sua profissão.
Foram quantos projetos desenvolvidos até hoje?
Nossa, mais de 50 projetos. Todos os
alunos que eu orientei foram indicados a prêmios, alguns foram premiados
e outros se tornaram professores.
O senhor já está produzindo novos inventos?
Já, estou produzindo a melhoria da
lâmpada de Mozart, o filtro bactericida de casca de barú… tem muitas
coisas que estou tocando simultaneamente.
O senhor nunca comercializou algum desses inventos?
Não, eu sou professor universitário, a universidade me paga para retribuir a sociedade, e é isso que eu faço.
A sociedade é grata ao senhor?
Eu não sei, não tenho esse retorno.
Falando do prêmio Global Teacher Prize, foram 8 indicados americanos ao
prêmio, eles foram recebidos pelo Obama, a indicada Argentina foi
recebida na casa rosada, a indicada italiana foi recebida pelo primeiro
ministro da Itália…
E o senhor foi recebido pela Dilma?
Não (risos), nem um tweet. Nem em Barra do Garças, nem um vereador, nada.
Falta apoio do poder público para a ciência?
Acho que cada sociedade valoriza os seus ícones.
O Brasil valoriza o que?
Não tem glamour nenhum em ser
professor, não é uma profissão de status, não é tão legal quanto ser um
jogador de futebol por exemplo. Esse cara que ganhou o prêmio Puskas
(gol mais bonito do ano) foi recebido em Goiânia com o aeroporto
interditado, foi um golaço, mas você não vai ver essa mesma repercussão
com um professor que fez um projeto bacana.
O que deve ser mudado no Brasil em relação a ciência?
Ciência é um processo de longo prazo e
investimento, não adianta você pensar que vai investir hoje e daqui um
ano terá resultado, estamos falando talvez de décadas de investimentos
pesados em ciência. Valorização da carreira docente, valorização do
pesquisador, aliás, o pesquisador não é uma profissão, não existe essa
classificação aqui. Para você se tornar um pesquisador no Brasil,
deve-se tornar professor universitário e aí sim você acaba fazendo
pesquisa. Nos Estados Unidos você pode optar por ser pesquisador ou
professor, aqui não, eu por lei sou obrigado a fazer extensão, pesquisa e
ensino. Agora você acha que é fácil eu sozinho fazer tudo isso? Eu
tenho que ir na sociedade enxergar os problemas que ela precisa e propor
uma solução, tenho que ir no laboratório desenvolver uma pesquisa e
publicar e tenho que ir para a sala de aula. Se eu pudesse focar só na
pesquisa, com certeza a minha produtividade com relação a isso iria
aumentar. Então nós temos um longo caminho a percorrer. O sonho mesmo
seria você ver um garotinho ou uma menininha falar “quando eu crescer,
quero ser cientista ou pesquisador”.
Parte da culpa pelas nossas crianças e adolescentes não se interessarem por ciência é da mídia?
Eu gostaria de ver as grandes
conquistas brasileiras aparecendo na TV, no jornal… a mídia poderia dar
uma contribuição gigantesca para popularizar a ciência, a inovação e
contribuir com a valorização da carreira docente e do pesquisador. Você
já ouviu falar da Bianca, que ganhou o prêmio jovem cientista? Sendo a
primeira Mato-grossense a ganhar o prêmio em 26 anos de história?
Não conhecia…
Foi a primeira do Mato Grosso, um
prêmio que existe há 26 anos. Você não vê muito prazer pela ciência no
Brasil. Se você digitar no “youtube” o nome “Kéfera”, vai ver vídeos com
mais de 4 milhões de acessos, mais de 350 mil “likes” por vídeo. Se eu
fizer um vídeo explicando o processo de fabricação da casca de castanha,
que isso pode gerar um material de sustentabilidade, de baixo custo, de
benefício… se eu tiver 100 likes é um efeito histórico. Eu assisti a
entrevista do primeiro ministro de Portugal, cortaram ele para mostrar
um jogador chegando no aeroporto. Eu gosto de futebol, adoro futebol,
mas temos que colocar cada coisa no seu devido grau de importância.
Uma profissão sem Glamour e sem grandes retornos financeiros. O senhor sempre quis ser professor?
Sim, eu tive a influência de grandes
professores que sabem muito bem o que é ciência, além de saber ensinar o
que é ciência. Então eu já queria isso mesmo, eu fui apresentado a
várias opções, mas escolhi ser professor.
Se fosse para escolher um país a fim de atuar como professor, qual país o senhor escolheria?
Brasil, sou brasileiro, gosto da
terra, e já vou especificar, escolho a região em que estou. Sou
Paulista. Fui convidado para dar uma palestra uma vez para uma turma de
pós graduação da Univar (faculdade particular de Barra do Garças) e o
pessoal falava assim, “Barra do Garças não tem opção”. Fiz uma
experiência, fiquei uma semana na cidade, voltei e falei “gente, vocês
estão em cima de uma mina de ouro, como não tem opções? A cidade tem um
rio maravilhoso, você pode desenvolver a indústria pesqueira, você tem
terra, você tem fruta, tem babaçu, barú, copaíba, mangaba. O que mais
que precisa?” Eu olho e enxergo centenas de oportunidades nessa cidade,
mas você tem que colocar a mão na massa e fazer acontecer.
A universidade remunera o senhor pelas pesquisas?
Não, pelo contrário, muitas vezes eu tiro dinheiro do meu bolso para bancar a pesquisa
O senhor gosta do conceito de universidade pública?
Gosto, mas a sociedade não sabe
aproveitar a universidade. Enquanto existir o conceito de que a
universidade é só para servir um grupo de pessoas que vão formar e
ganhar dinheiro, nós estaremos andando por um caminho errado. A
sociedade tem que dar uma despertada, por exemplo, vamos supor que eu
tenho um açougue, preciso processar a carne, cortar, que tipo de
embalagem eu vou colocar? Vai na universidade buscar ajuda, a
universidade está lá para atender a sociedade. Em 5 anos de instituição
eu nunca vi alguém bater na minha porta e dizer assim “eu sou um
produtor de leite e quero agregar valor ao meu produto, me ajude a
desenvolver uma bebida láctea?” Sim, é o meu papel, e eu não posso
cobrar por isso, porque o estado já me paga para fazer isso. Esse tipo
de coisa ainda precisa se espalhar um pouco mais.
Fonte:
Nenhum comentário:
Postar um comentário